domingo, 2 de novembro de 2014

Morcego Negro Ltda -- O Reino da Morte da Palavra

Cristian Korny
São José dos Campos, 25 de outubro de 2014.

Personagens:

Ei, Eugênio, o Eleitor Ingênuo
P, Porteiro do Palacete da Meritocracia
B, Bilheteira da Bisbilheteria
Do, Domador
Ma, Mágico
Ba, Bailarina
Pa, Palhaço

ATO UM

CENA I

Toc toc
P: Quem está aí? (Falando através da portinhola no portão)
Batendo no piortão do palacete da meritocracia'
Ei: Sou eu!
P: Eu quem? Tem Senha?
Ei: Não tenho
P: Aqui no Palacete da Meritocracia só entra com senha...
Ei: Não há outro jeito?
P: Não há... Outro jeito apenas para quem tem senha...
Ei: Mas...

Portinhola se fecha, pow...

CENA II

Ei caminhando desconsolado, chutando latas, de repente avista um parque temático:

MORCEGO NEGRO LTDA

e se dirige à bilheteria aonde lê-se "Bisbilheteria"

Ei: Boa Noite!
B: Boa noite, quantos ingressos?
Ei: Um só, quanto é?
B: Depende
Ei: depende do quê?
B:Vária variáveis, estatísticas, expectativas, projeções, câmbios, PIB, PiG, enfim... Você não sabe?
Ei: ? (Atônito)
B: Então, quantos ingressos?
Ei: Um só, já disse...
B: É que, às vezes, é necessário mais de um ingresso para entrar no parque... Mas... Agora, é que transcorreu algum tempo, o cenário muda, o número de ingressos também,..
Ei: Mas, eu continuo sozinho! Quanto é mesmo?
B: Você vai pagar em dollar, peso, rublo, libra, lira, euro, iene, bitcoin, real, títulos do tesouro, títulos da dívida, ouro, ações da Petrobrás, ações da Sabesp, da OGX, PP, OP?
Ei: Só tenho reais, e poucos
B: Então, o preço é determinado pelo logarítmo da expectativa futura de cenário de mercado construída no presente e pela média do limite do nível intelectual que você está usando agora...
Ei: Mas eu quero saber o preço, só isso...

B: O preço que você quer saber é determinado pelo mercado com base nas ações de curto prazo a depender do que você espera do futuro e desse prazo em que você estará no parque pelo limite do tempo na cauda longa do parque temático...
Ei: Ah, acho que será bom
B: No começo ou no fim do passeio?
Ei: Ué, deve ser bom, isso não basta? Tem dois preços?
B: Bom no começo é um preço, bom no final é outro preço, temos preço para bom no começo e no final, e para todo ruim
Ei: Deixa eu ver, todo ruim é de graça?
B: Tolinho, nada é de graça!
Ei: Tudo bem, eu quero ingresso para tudo de bom
B: Tudo de bom não tem, ou até tem, mas só para quem tem senha pro Palacete da Meriticracia, você pode escolher outro plano de expectativas
Ei: Caraio!, vocês querem ou não querem vender?
B: Nesse contexto, vender é só um detalhe, e muito desprezível, por sinal, nada determinante (risinhos)
Ei: Tudo bem, quero um deste último
B: Sim, mas vai pagar como?
Ei: Já disse, em reais
B: Mas,.. Reais passando pela Suíça, passando pelas Ilhas Caimãs, por Londres, por Mônaco? Cada histórico financeiro associado ao sistema de segurança e sigilo é um câmbio, em dinheiro ou cartão?
Ei: Peraí, pagar em dinheiro é diferente de pagar em cartão? O preço muda?
B: Claro! Grana viva tem a opção de caixa-dois e a gente tem de lavar, cobramos taxa para lavagem de dinheiro! Dinheiro de cartão já vem lavado...
Ei: Ok, ok, se a meritocracia tivesse me deixado entrar eu não passaria por nenhuma sabatina...
B: Política é só lá dentro
Ei: Tudo bem, nesse momento, quanto preciso desembolsar?
B: (Passa um papel aonde deve estar escrito o valor a ser pago)
Ei: Tá aqui! (Passa o dinheiro)
B: Nosso sistema de rede cibernética está acusando que você é nosso visitante número 1.000.000, e você conquistou o direito de ganhar grátis a entrada para nosso parque em regime de ingresso VIP com guias especialmente treinados...
Ei: (Cortando a explicação) Ufa, tudo isso para nada
B: Nada, nada, informação é de graça (Ironia)

Seja bem-vindo ao
MORCEGO NEGRO LTDA

CENA III

Est.:
Liberdade, liberdade
O que se faz por liberdade?
Segurança, segurança
O que se faz por segurança?
O preço da primeira é a segunda
O preço da segunda é a primeira
Não se pode ter as duas
Liberdade e segurança
Segurança e liberdade
Veja se você alcança
o preço da liberdade

1.
Todos pedem mais mudança
Mas de onde virá ela de verdade?
Quem fala-fala e não se cansa
Daqui só que que se vê é maldade

2.
São poucos que enchem a pança
Porque há miséria na cidade
Trabalho-trabalho e gastança
Sem lugar para a felicidade

3.
Eu queria mais uma dança
Eu queria viver a eternidade
Talvez, voltar a ser criança
E ter em meu viver prioridade

Est.
4.
Meu Brasil, minha esperança
E nele ponho meu melhor sonho
Mais uma ocupação invade
Na hora de leventar do sono

Est.

A CASA DOS HORRORES

Aqui você que entra
Deixe toda a esperança
aqui na Casa dos Horrores
É bem-vinda a matança
Aqui se pratica a gastança
Não é como o nome indica
aqui são bem-vindas as pessoas bonitas
No período eleitoral
Somos abertos e sensíveis
Acabou esse mal
Nos fechamos e dificultamos
E adeus povo
Aqui na Casa dos Horrores
Só crimes não previstos
Só crimes não previstos
Só crimes que não são previstos em lei

CENA IV

Ei se encontra com Ba, Ma, Do, Pa

1.
Nós contra eles
Eles contra nós
Todos contra nós
Todos contra eles
Eu você você eu
Se você acha que já deu
Devia poder fazer diferente
Para tanta gente que já deu
Meu, para tanta gente diferente

2.
Do: Agora diga, minha querida
Ba: Cansada de nivelar por baixo
Ba: Estão pensando que somos burros
Ba: Na nossa era do Conhecimento
Ba: Nem tudo se resolve aos murros
Ba: Botar essa ilusão toda abaixo
Ba: Entenda meu ponto de Partida
Ba: A facilidade descabida
Ba: Escuro é o entendimento
Ba: Luta muito então encontra a saída
Ba: Pois não a acharemos sem sofrimento

b.
Ba: A facilidade descabida
Ba: Escuro é o entendimento
Ba: Luta muito então encontra a saída
Ba: Pois não a acharemos sem sofrimento

1. b.

3.
Ataques pessoais nada mais
Que ataques pessoais
Isto eu sei fazer
Que qualificação é preciso ter
Para fazer ataques pessoais?

CENA V

Ei: aqui o que há
Do: Casa dos Horrores, amigos
Ba: Todas as piores maquinações
Ma: Eu compreendo os truques
Pa: Mas não revela, né?
Ei: Ali? (aponta)
Ma: Ah, ali é a joia da coroa
Pa: Aparelhamento de estado
Ba: E você acha que isso só existe no Estado?
Ma: É, há que se diferir Estado de Governo
Todos: Estado de Governo

1.
Preste atenção
No que vou lhe dizer
Virou um chavão
Para o poder esconder de todos
O que ocorre
Não salva nenhum corre
Quem fala morre
Sem poder se defender

Est.
O aparelhamento de estado
Não levanta suspeitas sobre
O aparelhamento privado
Controlar-controlar
Para não salvar,
mas para submeter dominar

2.
De pulo em pulo
Já tenho o alvo
Quem fala com quem
Meu caros metadados

3.
Que você saiu de casa (eu sei)
Encontrou a namorada  (eu sei)
Aí comeu mortadela  (eu sei)
Depois mudou o canal  (eu sei)
Mais um cara legal  (eu sei)

4.
Que você andou de carro (eu sei)
E beijou na boca ontem  (eu sei)
Está engordando menos  (eu sei)
Omitiu a opção sexual  (eu sei)
Não provou o vegetal  (eu sei)

Est.

5.
Que fumou mais maconha (eu sei)
Que deixou de fumar (eu sei)
Tudo o que você fez (eu sei)
Ou que deixou de fazer  (eu sei)
Tudo hei de saber (eu sei) rubrica: este último com enfado , cansado de saber

Est.

6.
Mas de tudo o que eu sei
Uma coisa não preciso saber (eu sei)
De tudo que eu já sei (eu sei)
Não preciso sabe seu voto
Por que tudo o que interessa (eu sei)
Porque para lhe controlar
Há toda uma rede de informação
Um erro no sistema
Um ponto na curva
Não temos a vista turva
Caso, vire um problema
Haverá condenação
Mas, não irei lhe dizer
O que está na mente do grande Irmão

Est.

7.
Quem desobedeceu (matei)
Todos os dissidentes (matei)
E os retardatários (matei)
Quem ousou pensar por si (matei)
E ninguém notou como eu (matei) rubrica: esse último com mais violência

Est.

CENA VI

Ei: Cara, isso tá mais feio do que eu pensava
Todos: Não há mais vida na Terra arrasada

Você vai se apavorar
Porque seu mundo vai ruir
Faltará chão para seus pés
E faltará pão para sua fome

Faltará sobretudo atenção
Porque você sequer desconfia
Que todo esse discurso bonito
Está ocultando o truque, a intenção

Sucesso para lhe escravizar
Qualidade para lhe julgar
Resiliência para lhe quebrar
Persistência
Para se esforçar
Confiança para se expor
Meritocracia para expulsar
Competência em lhe rebaixar
Competência em lhe rebaixar

Então, muita calma nessa hora
Essa é a cilada de se cair
Para todo lado tem um viés
Mas, para nenhum ali há um nome

Este é o tal do choque de gestão
Porque você sequer desconfia
Que todo esse discurso bonito
Faz um novo estado de exceção

Fracasso para lhe iludir
Competição para lhe destruir
Comentários para lhe banir
Concorrência para lhe mentir
Motivação para lhe sugar
Meritocracia para lhe expulsar
Administração em lhe controlar
Administração em lhe controlar

CENA VII

Ei: Quem são aqueles enjaulados?
Pa: São os que estão fora do esquema
Ba: Iguais a você
Ma: Sabemos que foi barrado no Palacete
Ei: Como sabem?
Do: Forças ocultas sabem de tudo
Ei: E quem é aquele fora da jaula solto e ameaçando os enjaulados que não podem fugir?
Do: É um corrupto, ao qual, não se prova absolutamente nada, pois tem muitos testas...
Ei: Peraí, se esse é o povo, então ele é o dono do espetáculo! Deste parque temático!
Do: Agora você pode entender por que se inventa tanta técnica econômica como a que você enfrentou em nossa Bisbilheteria
Ei: Claaaro, sem todo aquele obscurantismo o povo pode entender o que ocorre
Do: O poooovo
Ei: Não troce!
Ma: Por quê? No fundo são escravos que amam a escravidão, acontece que só veem a escravidão no outro
Ei: Amor fati é uma qualidade difícil
Ma: Mas amor ao destino é válido apenas quando você está consciente dele
Ei: Seu caráter, seu destino
Do: Calma, os horrores nem terminaram ainda

1.
Eu sou uma pessoa de bem
E não tolero esquemas
Quero distância dos problemas
Com minha honra tudo bem

2.
Eu pago meus impostos
Pagos mais que meio mundo
Que não venha vagabundo
Zoar gestos, gastos e gostos

3.
Um errinho todos cometem
Uns poucos são descobertos
Menos ainda são abertos
E essa sociedade, eles refletem

4.
Minha corrupção não é tema
A denúncia para existir
Todos terão que comigo cair
Mas todos estão no esquema

R.

5.
Um caso ou outro vacila
E quem vacila cai no instante
Quem mandou cair o vacilante
Quando tendeu a furar nossa fila?

6.
São poucos pecados
Tudo certinho nada anda
Aqui, até a polícia comanda
Para o leite dos padrinhos

R.
7.
Errado é o que ninguém faz
Passar sinal vermelho jamais
Um empreguinho pro filho apraz
Quem nunca foi disto capaz?

R.
Corruptos são os outros
Os maus devem morrer
Os bons devem viver
Para os amigos tudo
Para o resto a lei
Tudo depende de quem
vai falar bem de você
Tudo depende de quem
vai falar bem de você

CENA VIII

1.
Não falei
Não Ouvi
Não vi
Estou em todos os lugares
E não estou em nenhum
Não estou nem aqui
Sou a bênção sobres meus afetos
E a maldição sobre os malfeitos

R.
Corrupção é só no governo
A empresa privada é honesta
Mas quem mais ganha na festa
É o segredo mais guardado do inferno
Corruptores são lenda urbana
São os caras mais bacanas
Deste nostro conturbérnio

2.
Você não vai ouvir falar de mim
Você nem ousará ouvir de mim
Sequer verá o tudo que vi
Mas saiba logo
Não falei
Não ouvi
Não vi

R.
3.
E a grana corre para quem falar minhas mil línguas

4.
Esqueça que existo, para o seu próprio bem
Ei: E esses quem são?
Todos: Shhhhh (com o dedo nos lábios)

TREM FANTASMA

R.
Um na frente
Outro atrás
E o trem fantasma
Leva-e-traz
Vai-que-vai

Passa pelo motorista
Passa pela secretária
Passa pelo deputado
Passa pelo senador
De favor em favor
A pleno vapor ele vai
De vagão em vagão
Vagando no congresso
E em cada eleição
E ele vai

E a cada fantasma
Uma grana a mais
Pelos tubos dos fantasmas
Ela sai

Cai este, e aquele cai
Mas o trem fantasma vai-que-vai

R.

CENA IX

Ba: Agora Saímos da Casa dos Horrores, mas não pode melhorar...

1.
Alternar, alternar
Para azeitar a máquina
Precisamos fazer mágica
Então vamos mudar
Para que tudo continue como está

2.
Eu saio, não saio
Depende de quem eu traio
Eu caio não caio
Depende do quê eu trago

3.
Antes de mim sou eu
E eu vim comigo
Trouxe comigo meu amigo
E só saio, se caio
Mas é sempre do mesmo balaio

4. 6.
Todos querem derrubar do poder
Derrubar do poder todos querem
Só não quer sair do poder
Quem está no poder não quer

5. 7.
Todos querem se achegar ao poder
Se chegar ao poder todos querem
Sim quem quer cair no poder
Quem está sem poder só o quer

8.
Ninguém quer sair, todo querem ficar
Não poderia dividir
Para todo mundo governar?
Vamos resumir para explicar
Alternância no poder
Só é bom no lado de lá
Só é bom para quem no poder não está...

Pa: Então, gostou da alternância no poder?
Ei: Que alternância? Se é um só poder?
Do: Boa observação...

CENA X

Política Metafísica Dialética
Ética Estética Técnica

O que poderia ser política
Ao olhar pra dentro metafísica
Ao nossos passos seria Dialética
A aparição ah se fosse estética
A nossos costumes com ética
Menos étnica e mais técnica
Assim seria a boa e velha Política

Do: Entendeu?
Ei: Não!
Pa: Podemos repetir de outro jeito
Ei: Tá certo...

1.
A arte do poder é a política
A palavra vem daí
Mas a arte que se faz
No seu jogo me faz rir

2.
O misticismo é a metafísica
A palavra não vem
O silêncio é capaz
De falar a nós também

3.
E quando manjamos dialética
A palavra é parte
Dois pra lá, dois pra cá
Vide-verso, seu aparte

4.
Esta é bela até mais estética
A palavra explode
Ninguém ode escapar
A pega, bate e sacode

5.
Sequência natural é a ética
A palavra é dita
Sendo ela feia ou bonita
Participa desta fita
6.
O elaborar conduz à técnica
A palavra produz
Sentido e faz sentido
No tempo em que ela reluz

7.
Quando faz centro pobre étnica
A palavra segrega
Separa gregos e baianos
Faz-nos todos desumanos

Do: Entendeu?
Ei: Não
Do: Se fosse fácil
Do: Todo mundo era
Do: Se fosse comum
Do: Todo mundo tinha
Do: Se fosse rápido
Do: Todo mundo alcançava
Ei: Velha política
Do: Velha e boa política
Ei: O que seria a Nova Política? Ignorar a Grécia Clássica? Por exemplo?
Do: Esse é o ponto: cancelar toda a história humana em nome de um discurso moralista e midiático...
_______crítica técnica étnica estética
_______política sifilítica raquítica réplica
_______dialética tétrica mórbida lépida
_______metafísica tácita fática fálica
_______diabólica lúgurbe fúnebre tréplica
_______quanto mais difícil a teoria
_______melhor para malhar a poesia

ATO DOIS

CENA XI

Ma: Agora o assunto é sério
Pa: Vamos falar em Deus
Ba: Cuidado, pois a danação na terra começa em transformar alguém am mau, depois saquia-se esse alguém, isso, surge do nada, isso, vem do céu, não tem responsáveis...
Pa: Quando não é a vítima a própria responsável no discurso do individualismo
Do: E nada melhor para julgar e condenar sem direito de defesa do que Deus, ninguém questiona...
Ei: Eu já estou no inferno, já fui saqueado, não tenho nada mais a perder...
Pa: Tem sim, está vivo, por enquanto
Ma: Mas, o dono do circo tem fé
Todos: Ninguém se atreve a heresia, por mais que haja hipocrisia, de um lado, alimentando a histeria, de outro
Ei: Não seria lado de cima e lado de baixo?

1.
Por favor, deus de poder
Que a tudo pode conceder
Minha sincera hipocrisia
Para semear muita histeria
Basta-me dez por cento
Um lícito reconhecimento
De meu próprio enriquecimento
Não deixai, ó todo poderoso
Que eu perca a eleição

2.
Será acusado de heresia
Quem acalmar a histeria
Que eu vejo como fervor
Em adoração ao senhor
Um som pobre num lamento
Oculta um podre entendimento
Promessas pós-sepultamento
Sendo eu tão orgulhoso
Possa eu perder a eleição

R.
3.
Quem ousar renegar a fé
Não conseguirá ficar de pé
Se rendeu à filosofia vã
A não colherá amanhã
De todas essas, a pior heresia
É desmontar a hipocrisia
Que faz do fervor histeria
De todos o mais poderoso
É quem vence a eleição

R.
Bênção para quem é do bem
Pelo senhor escolhido
Para quem é do mal, danação
Deus não mexe com dinheiro
Mas pode deixar no meu tesoureiro
Que ele fará distinção
E adquirir grande poder
O escolhido para vencer
A disputada eleição

CENA XII

R.
De todos, o pior fantasma
São os formadores de opinião
Que lançam essa dúvida
Com o nome de Opinião Pública

1.
Opinião que exige explicação
Desde o cataclisma do clima
A chuva que não vem de cima
Para refrescar do calorão

2.
Eu sei que não é mais que ficção
O jornal escrito não anima
Essa cega busca por uma rima
Que está proibida na televisão

R.
3.
A ficção nossa de cada dia
O povo quer ver é a garantia
Uma mentira mil vezes dita
Para virar a verdade em que se acredita

4.
Este espectro desmaterializado
Sem corpo, indeterminado
Tudo são pontos de audiência
Se pelo menos fossem suturados

R.
5.
No fim das contas, a opinião
E um serviço prestado à Nação
Por pessoas sem noção
Que têm pavor de dar uma opinião

F.
A opinião espectral
Foi a invensão mais legal
Da televisão
Quando não é de ninguém
Aí que tem razão
e todos apoiarão
Quando não é de ninguém
Aí que tem razão
e todos apoiarão

Ei: Tá feio o bagulho
~ôxe~

MONTANHA RUSSA

A toda velocidade
As coisas mudam de lugar
Dão até enjoos
Todos esses voos
E essa falta de ar
Para ninguém entender
O que está acontecendo
Subindo e descendo
Acho que vou vomitar
Um momento sobe
No seguinte desce
Crises e bonanças
Um dia estou bem
Mas nem sempre bem
No outro estou mal
E outro dia também
Quando tudo melhora
Ouvem-se barulhos
Quando tudo piora
Eu sinto engulhos
À toda velocidade
As coisas mudam de lugar
Nessa montanha russa
Da nossa vida
Sofrida sem respirar

CENA XIII

Ei: Bolivarianismo, eu já ouvi falar
Do: Não é perfeito, mas tem gente que precisa para não padecer na fome, na inanição e na miséria
Ei: E por que é tão combatido?
Ba: Porque é combativo...
Do: Simples, para que as pessoas trabalhem mais é preciso coagi-los, não pagá-los, fundamentalismo desenvolvimentista,
Ei: coisas de um histórico escravocrata
Do: Isso

1.
O de cima, sobe
O de baixo, desce
Nessa montanha russa
Do sitema capetalista
Ao apelo populista
Racional irracionalista
Bolivariano parou na pista

R.
2.
O de cima, sobe
O de baixo, desce
Nessa montanha russa
Da nossa servidão diária
É por brigar por migalhas
Por medo de medalhas
Ou sou coxinha, ou sou petralha

3.
O de cima, sobe
O de baixo, desce
Nessa montanha russa
Cada ponto que suba a audiência
Se refletirá na urna
Será melhor voltar à urnas
Por amor ou por impaciência

Est.
É por sentir o sofrimento alheio
Por esse pouco de sensibilidade
Que se defendem programas sociais
Que se possa afirmar sem receio
E sem medo. toda a felicidade
Assim se garantem oportunidades
Não são medidas irracionais
Não é quase nada, nada de mais
Não lhe fará falta, pelo bem que causa
Pelo bem que faz

Do: Sacou?
Ei: Tem gente explorada nesse mundo

RODA GIGANTE

Nessa roda gigante
Em certos momentos
Em que tudo vemos
Belas paisagens
Brisa nos cabelos
Acontece que dura pouco
O belo passeio
Temos de voltar à Terra
Á guerra do dia a dia
O pagar mais uma vez
E seguimos pagando
O preço do brinquedo
Para quem o brinquedo fez
Mas sempre tem um tranco
Para que esqueçamos
Tudo o que vimos
Perdendo dessa maneira
Uma vida inteira
Enquanto subimos e caímos
Bela rasteira.

CENA XIV

Ei: Esse assunto de economia é um saco
Pa: Olha, não faça isso, faça um esforço
Ei: Como assim?
Pa: Conhece a resposta para todas as perguntas?
Ei: Qual?
Pa: A economia, estúpido!
Ei: hmmm, É sua a frase?

1.
Na roda gigante
Da economia mundial
O capital corre solto
E o homem preso num local
Há quem não pare num canto
Outro se desespere num pranto
Para alguns é só um jogo
Com um papo demagogo
Para outros escassez
Encarada com desfaçatez
No vídeo produzido eleitoral

2.
Na roda gigante da economia
Inventaram de nome de glocal
Todos submetidos à normativa
E tomando no orifício anal

3.
Na roda gigante da economia
Muito importa quem tá na linha
Quebrou, joga fora, morta ou viva
A mentalidade mais mesquinha

4.
Na roda gigante da economia
Nada escapa de ser mercadoria
Insalubre, arbitrário e precário
Desde o trabalho até a moradia

5.
Na roda gigante da economia
O segredo é girar no eixo
Para quem está fora de lugar
É como um soco no queixo
Na roda gigante da economia
Nem tem mais graça em falar de mais-valia
Luta de classes é todos contra todos
e a relação de capital e trabalho
é acachapante e sufocante
esmaga as gentes
Na roda gigante da economia

6.
Mas algo de bom que se guarde
Antes que tudo desabe
E que seja tarde
O capetalismo destrambelhado
Sendo salvo de si mesmo
Por bancos de estado
Salvando o capital privado
Sem nenhum segredo

Ei: Como disse alguém, crise é o próprio capitalismo

BARCO DO AMOR

Aquele que rouba
O outro dá boa-ação
com a outra mão
Tem uma bênção
Um outro, traição
Aquele que falta
Tambem armado
Na tensão
O outro cansado
O pai e o irmão
Quem não dirá
Que aquilo que faz
Não o faria por amor?
Ou não faria por paixão?
Estamos todos no mesmo barco
Um barco furado
Com água pelo chão
É o barco do amor
Indo a pique no tufão
Em plena tempestade de verão

CENA XV

Ei: E agora?
Ba: É a ética da coligação
Ei: Isso é bom ou ruim?
Ba: Um mal necessário
Ei: Foi alguém que disse que a democracia nem é boa, mas é o melhor que nós temos, a menos pior...

1.
Eu sou o rei da coligação
Político de fino trato
Junto aliados e oposição
Sempre atento ao fato
De ser da situação

2.
Vamos fazer a coligação
De lá, de cá, governança
Bem juntinhos, transação
Ninguém é mais criança
Pra ser um sem noção

R.
Que Deus abenções essa união
E nossa senhora coligação
É tudo o que desejava a nação
Desde os párias até a televisão

3.
De lá, de cá, a coligação
A governabilidade
Dita a nossa posição
Agressividade
De regra e exceção

R.
4.
Vamos fazendo coligação
Fazendo coligação
E vem, e vai, vai e vem
Para o nosso bem
A nossa solução

F.
Eu já não faço coligação
Governabilidade tem limites
Sou o único que une o país
Saciando apetites
Não sou eu quem diz
É a liberdade de expressão

F2.
Sigamos nesse barco do amor
Que já virou uma bacanal
A suruba pelos privilégios
Da instituição estatal
Na privada não é melhor
Sem corruptores, sem corruptos
100 corruptores, 100 corruptos
É dando que se recebe
E uma mão lava a outra
Quem semeia ventos
Colhe o que plantou...

Ei: Quem semeia ventos, colhe tempestades
Ba: Furacão, tornados, secas, inundações, rsrs
Pa: Quem semeia peidos, rsrsrs

CENA XVI

Ei: Felação premiada, rsrsrs
Ba: Relação premiada, rsrsrs
Ma: É sim...
Ei: Mas por que o áudio nunca aparece?
Ma: Poisé...

R.
Tiro ao alvo
Delação premiada
Briga de foice no escuro
Tiro ao alvo com a luz apagada

1.
Senhor tecnocrata
Sabe lá o porquê
desonrou a gravata
Entrou na deprê

2.
Senhor tecnocrata
A chapa esquentou
Acabou a mamata
E o bico rachou

R.
3.
Senhor tecnocrata
Ontem, queridinho
Ou morre ou se mata
Perdeu o padrinho

4.
Senhor tecnocrata
De tantos segredos
E tantas bravatas
Coleciona medos

R.
F.
Senhor tecnocrata
Tem de se queimar
Não pode recusar
E segue a mamata
O show tem de continuar
E segue a mamata
O show tem de continuar
Acabou teu carnaval
Seleção premiada
Em período eleitoral
Ação orquestrada
Repetida
Esquecida
Pela plebe
Desmemoriada
De uma gravação
Desaparecida (que gravação?)

Ei: Mas a memória está voltando
Ma: Sim, a história nunca chegou ao fim...

CENA XVII

Ei: Bate-bate cabeças
Ma: A mágica da repetição
Ei: repetição para desorientação
Ma: repetição para amnésia

R.
TODOS SOMOS BATE-BATE
FICAMOS NOS BATENDO
PIRULITO QUE BATE-BATE
CARINHO QUE BATE-BATE
CARRINHOS DE BATE-BATE
NUM CERCADO EXTREMO
ACIMA FAÍSCA DE ELETRICIDADE
ABAIXO CIMENTO LISO
PRESOS DE UMA À OUTRA
EXTREMIDADE
FOMOS ÀS RUAS
FOMOS ÀS URNAS
PARA MANTER A APATIA
E A PASSIVIDADE

BATE-BATE CABEÇAS NA ENGANAÇÃO
BATE-BATE CORAÇÃO NA SOLIDÃO

BATE-BATE CABEÇAS NA ENGANAÇÃO
BATE-BATE CORAÇÃO NA SOLIDÃO

1.
Todos somos carrinhos de bate-bate
Bombardeados por luzes faiscantes
E sons muito hipnotizantes
Que a nossas memória abate

2.
Todos somos carrinhos de bate-bate
Presos num espaço pequenino
Tratados todos como meninos
Sinal de carinho a que nos cabe

3.
Todos somos carrinhos de bate-bate
Acabou a diversão com a energia
Durou apenas um breve momento
Amnésia garantida, xeque-mate


Ma: Por isso a memória é importante, para que não fiquemos perdidos, para respeitarmos a nós mesmos também e sobretudo, dividir para governar
Ei: E o áudio nunca aparece, e para uns é dossiê, para outros apenas um mal necessário, ainda podem ser coisas infundadas contra quem quer que seja, é um, perigo, um controle, mas insistimos em achá-las absurdas
Ma: Observo
Ei: Absorvo

SALA DOS ESPELHOS

1.
Não aceite nenhum conselho
Nossa imagem da semana
Está num partido espelho
Que a nenhum de nós irmana

2.
Uma imagem invertida
Num quarto escuro
De uma casa sem vida
Buscando a fresta no muro

3.
Não aceite nenhum conselho
É nossa vida que assim se dana
Nos quebraram nosso espelho
Por um fio pra sair da lama

Est.
A sala de espelhos
É um labirinto
Sem fio de Ariadne
Ou asas de Dédalo
A sala de espelhos
É um labirinto
Que vemos infinito
No fundo do que sinto
Na verdade do que minto
Perdido no meio do recinto
A sala de espelhos
Sete anos de azar
Por setenta anos
Para sair de lá

1.
2.
3.

CENA XVIII

Ma: Desaparecem como que por mágica

1.
Sabemos de toda sua vida
Manter o clima de moralismo
De outro modo não há chantagem
Um dossiê para todo mundo ver
Difamação, fofoca e espionagem

2.
Em breve, você sobrará
Sozinho, vamos lhe tirar tudo
Você no olho da tempestade
Um dossiê para todo mundo ver
Será quebrada essa sua vontade

Est.
Mas, em lugar de um adversário
Estiver algum dos nossos
Não seremos otários
De fazer isso com um dos nossos
Não concederemos espaço
Para mentiras levianas
Então o tempo ficará escasso
Depende de quem se difama
Em breve, também, no seu bairro
A explicação rasa que a todos engana
3.
Nem todos serão destruídos
Somente aqueles que conspiram
Seguindo condenados as penas
Um dossiê para todo mundo ver
Critério, temos para nós apenas

Est.

Ma: Ou são martelados diariamente por anos a fio até serem condenados socialmente, independentemente da sentença, ficam aniquilados

CENA XIX

Ei: É, daqui a pouco proíbem alguns políticos de fazer algo pelo povo, a tirada do rouba mas faz por que apenas querem se eleger
Do: Tem pior, tem o rouba, mas não faz...
Do: Quase conseguiram fazer isso aí no caso dos médicos marcianos, lembra?
Do: Proibir pela lei
Ei: Se as leis foram feitas por políticos, você já viu, isso diz muito sobre elas

R.
Medidas eleitoreiras
Em tempo eleitoral
Seria melhor proibir
Um benefício à população
Em período eleitoral

1.
Quando os mandatários
Acham quem somos otários
E nada fazem por ninguém
Apenas para seu próprio bem
O que é feito é ignorado
Mas no período eleitoral
Passa a ser divulgado
Vem logo a acusação
De ser para ganhar o eleitorado
Ué, teria de ser o contrário?

2.
Quando os mandatários
Feitos beneficiários
Preferem ter uma quadrilha
Ou benefício de sua família
O eleitor então é iludido
Mas isso dito não é legal
Pode ser escondido
Vem logo a acusação
De ser para ganhar a eleição
Ué, vamos assim fazer mal?

CENA XX

Do: Agora você vai saber quem doura a pílula, quem faz parecer bom aquilo que lhe prejudica, quem faz o escravo amar a própria escravisado (cada um no seu quadrado)
Ei: O Marqueteiro
Pa: O Marqueteiro são os outros

1.
Versado nas forças ocultas (Incultas)
Aí vem o rei da bruxaria
Quem os opositores insulta
Sempre em boa companhia

2.
Usa bem a vergonha alheia (tapeia)
Apela sempre para a baixaria
Nunca lhe falta uma ideia
Para perpetuar a patifaria

R.
3.
Veja como a imagem é limpa (tão linda)
Tudo precisamente calculado
Um humor perfeitamente supimpa
Candidato como sempre bajulado

4.
Manter o nível pasteurizado (calado)
Para a sempre boa digestão
Não vamos clarear o eleitorado
Ou abrir as mentes nação

R.
O Marqueteiro e sua habilidade
De aparentar que mostra a realidade
Mas o desafio é de esconder de você
O que realmente ocorre no poder (foder)

Ei: E ele faz tudo por amor a profissão e o mais autêntico profissionalismo
Pa: Isso foi marqueteiro de sua parte...

CENA XXI

Pa: Agora, um privilégio que o marketing transformou em direito:
Pa: A sacrossanta Liberdade de Expressão
Ei: Mas é direito constitucional
Pa: É sim, mas quem tem acesso a televisão?
Ei: Quem tem muito dinheiro ou pouco caráter
Pa: Seu caráter, seu destino

R.
Liberdade de expressão
Trata-se da minha
Não é da sua visão
E não mostre esta razão
A ninguém da população

1.
Estava tudo na sua frente
Nesta sala de espelhos
Vamos evitar mostrar para toda a gente
E dar sempre bons conselhos

2.
Uma ideia diferente
Rejeitamos o vermelho
Nunca nos verão criticar o capital
Mesmo em seu destrambelho

R.
3.
Algumas pessoas são cortadas
Alguns assuntos, proibidos
Muitos esfoques editados
Harmonia e não conflitos

4.
Vamos dizer que são técnicas
O que na verdade é estratégia
Para quem criou as técnicas
Estava pensando em estratégia

R.
1.
2.

5.
Se tudo pode ser dito
Por que só o bonito?
Se nada é proibido
Não vale o sem sentido?
Mas são padrões fixos
E sempre repetidos
Para sermos esquecidos

f.
E é assim que será
A censura é velada
Falsidade revelada
Travestida de razão
Liberdade de expressão
Nunca na casa errada

Ei: E parece tudo tão belo, bom, certo e honesto...

CENA XXII

Ei: Amigos, vi muita coisa suspeita, errada mesmo, mas é melhor do que engavetá-las, ou esquecelas, ou escondê-las, mas prefiro ser ingênuo do que um mala destes engravatados
Ei: Sim, a ingenuidade na malandragem
Todos:

1.
O que devem ser?
Criar é dizer o que não viveu
Falar de alguém além do seu próprio eu
Ter o cuidado de reter
Alguma coisa tem de sobreviver

R.
2.
Criar viver o que não viveu
Vencer correntes bem no centro do eu
Ser um pedaço de seu ser
E outro pedaço de um outro ser

R.
Est.
Encontrar, ver, viver e sobreviver
A beleza na feiura
A alegria na tristeza
A riqueza na pobreza
A doçura na amargura
e a luz na escuridão
sim, meu irmão
e a luz na escuridão
sim, meu irmão
e a luz na escuridão

R.
Assim,
Viver o que não viveu
Reter para sobreviver
E se capaz de ver
A luz na escuridão
e ser capaz de ver
a luz da escuridão

R.


Texto para Oficina Línguas do Poder na OC Altino Bondesan, a pedido de Johana Albuquerque, com base nas matérias da Carta Capital de 24 de setembro de 2014: A Semântica das Urnas (Nirlando Beirão) e Expectativas Irracionais (Luiz Gonzaga Beluzzo).

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